José Bernardo
Série Vocação: sete estudos bíblicos nos evangelhos para entender vocação conforme a Bíblia. A grande maioria dos alunos da escola de liderança para adolescentes e jovens – Pacificadores é de vocacionados ao ministério. Nesta série de estudos bíblicos você encontrará a visão bíblica (nos evangelhos) sobre este assunto.
Conforme você chega à adolescência e juventude, começa a se perguntar que carreira deve buscar e como se preparar para ela. Nesse momento, termos como vocação, talentos e sacerdócio são reforçados em seu vocabulário. Infelizmente, entre pessoas que amam o mundo e as coisas do mundo, que estão cada vez mais distante daquilo que Deus prefere, tais palavras perdem o significado original que tinham na Bíblia e no cristianismo; assim fica impossível definir a vocação. Então, quero convidar você a voltar ao princípio e pensar no real significado do chamado.
Leitura bíblica: Marcos 1:16-20
16Andando à beira do mar da Galiléia, Jesus viu Simão e seu irmão André lançando redes ao mar, pois eram pescadores. 17E disse Jesus: “Sigam-me, e eu os farei pescadores de homens”. 18No mesmo instante eles deixaram as suas redes e o seguiram.
19Indo um pouco mais adiante, viu num barco Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, preparando as suas redes. 20Logo os chamou, e eles o seguiram, deixando seu pai, Zebedeu, com os empregados no barco.
[V] Sigam-me!
Embora Marcos não relate isso, conforme o próprio João, um dos chamados por Jesus nesse texto, eles haviam encontrado Jesus anteriormente e se tornado seguidores dele (Jo 1:35-42). Conforme aquele relato, André e muito possivelmente João eram discípulos de João Batista. Ele lhes apresentou Jesus e eles o seguiram. Depois André apresentou Jesus a Pedro, coisa que João também poderia ter feito ao seu irmão Tiago. Esse primeiro encontro aconteceu enquanto estavam na Pereia, a leste do Rio Jordão, mais perto de Jericó do que de Jerusalém. Depois eles voltaram para a Galileia, provavelmente seguindo Jesus quando ele passou por Sicar e pregou para os samaritanos ali. Quando chegaram à sua terra, aqueles irmãos e sócios (Lc 5:10) teriam voltado aos seus negócios e à vida cotidiana, ainda que continuassem a considerar Jesus o seu mestre.
- No primeiro relato, qual a situação inicial dos irmãos Simão (Pedro) e André e qual a atitude originadora de Jesus? “16Andando à beira do mar da Galiléia, Jesus viu Simão e seu irmão André lançando redes ao mar, pois eram pescadores”. É interessante notar que o termo traduzido como ‘pescadores’ tem raiz em ‘mar’. Eles eram homens do mar, o que nos fala mais sobre o ambiente e a identidade deles do que de seus objetivos específicos. Eles lançavam redes porque essa era a sua vida, seu ambiente. Jesus andava intencionalmente ao lado do mar, não era uma caminhada a esmo. Então ele ‘vendo’ Simão e seu irmão André agiu como segue. O verbo utilizado no grego já indica uma visão metafórica, ainda mais quando está no tempo aoristo como aqui: Jesus conheceu ou até reconheceu os dois irmãos e esse foi o ponto de partida.
- Depois de especificamente ver os dois irmãos, o que Jesus lhes disse, ou em que se constituiu o chamado dele? “17E disse Jesus: ‘Sigam-me, e eu os farei pescadores de homens’”. A expressão traduzida como ‘sigam-me’ é composta de verbo, advérbio e pronome. O verbo já dá a ideia do comando ‘venham’, portanto, ‘venham atrás de mim’. O termo traduzido como ‘disse’, também está no aoristo: Conforme Jesus foi vendo também foi dizendo, venham atrás de mim. A expressão ‘pescadores de homens’, porque se refere ao ambiente do mar, indica uma mudança do ambiente onde há peixes para aquele em que está a humanidade. Temos três elementos no chamado de Jesus: o imperativo de seguir atrás dele, a promessa de que é Jesus quem vai fazer, a indicação da mudança de ambiente, do mar de peixes para o mar de pessoas.
- Como os irmãos, Simão e André reagiram ao chamado de Jesus? “18No mesmo instante eles deixaram as suas redes e o seguiram”. A expressão traduzida como ‘no mesmo instante’ é o advérbio ‘imediatamente’, derivado do adjetivo que significa ‘direto’. A ideia é a ausência de obstáculos, eles seguiram Jesus sem ver ou colocar qualquer obstáculo, ideia bem representada pelo deixar as redes. Essa atitude também representa o deixar o ambiente do mar e as atividades relativas a ele. As redes eram um equipamento custoso e exigente, mas eles deixaram uma das atividades profissionais mais prestigiosas da região, deixaram a vida em que sua família estava envolvida e os bens que acumularam com aquela atividade. O verbo usa do para ‘seguiram’ é diferente do usado no verso anterior: tem o sufixo ‘caminho’, significando que eles tomaram o mesmo caminho que Jesus, passaram a andar no caminho dele, implicando em uma jornada, uma continuidade. Desse modo, para os três elementos do chamado, Marcos descreve uma resposta com três características: foi direta (sem obstáculos), incluiu renúncia e implicou em continuidade, em uma caminhada com Jesus.
- No segundo relato, qual era a situação de Tiago e João e qual foi a atitude originadora de Jesus? “19Indo um pouco mais adiante, viu num barco Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, preparando as suas redes”. O termo traduzido como ‘preparando’ indica a organização das redes, possivelmente no final da pesca, portanto na etapa seguinte àquela do relato anterior. Novamente, os discípulos estão no meio de uma atividade cotidiana, organizando as redes, em seu ambiente, um barco ao mar. Andando um pouco, seguido de perto por Simão e André, Jesus foi vendo, discernindo, conhecendo ou reconhecendo a Tiago e João. Esse fluxo determinou os eventos seguintes.
- O que Jesus fez depois de especificamente ver os dois irmãos e que mudança isso produziu na vida deles? “20Logo os chamou, e eles o seguiram, deixando seu pai, Zebedeu, com os empregados no barco”. Novamente, agora com Jesus, aparece o conceito de ‘imediatamente’ como sem obstáculos, sem impedimentos. Jesus reconheceu aqueles dois discípulos em um barco, na atividade de organizar as redes, entre seu pai e seus empregados, e nada disso impediu Jesus de os chamar. Temos aqui o termo grego para vocação, gr. kaleó, chamar, convidar, convocar. Há 148 ocorrências desse termo no Novo Testamento em suas diversas formas. Ao chamado de Jesus, eles ‘o seguiram’, esse verbo inclui o prefixo grego para se apartar, mesmo prefixo que também encontramos no original para ‘deixando seu pai’; portanto, a ênfase no versículo é a renúncia, o deixar o apartar-se de alguma coisa. Atender ao chamado de Jesus implicou na renúncia da proximidade com o pai, do barco e dos empregados: relacionamento, propriedade e empreendimento.
A seção seguinte começa assim: “Eles foram para Cafarnaum e, logo que chegou o sábado, Jesus entrou na sinagoga e começou a ensinar” Mc 1:21. Eles ainda estavam na região onde viviam, agora, em um relacionamento, ambiente e atividade completamente novos. Eles eram discípulos de Jesus e foram chamados para uma nova dimensão do discipulado, uma instância superior de seguir.
[O] Eu os farei
Marcos declara o seu objetivo ao escrever o Evangelho e particularmente o primeiro capítulo, já no primeiro versículo: “Princípio do evangelho de Jesus Cristo, o Filho de Deus” Mc 1:1. Ele vai contar a boa notícia a respeito de Jesus Cristo e no primeiro capítulo ele relata como tudo começou. O anúncio de Isaías, o anúncio de João Batista, o anúncio do Pai, o início do ministério, o primeiro enfrentamento do maligno, o começo da evangelização, o chamado aos discípulos, a inauguração do ministério de ensino, de curas e das viagens missionárias. Portanto, nos versículos que examinamos, Marcos quer nos ensinar como Jesus começou a chamar as pessoas. Essa história é um modelo do chamado.
- Ação: o chamado ou vocação, conforme esse relato de Marcos e passagens paralelas (Mt 4:18-22; Lc 5:1-11) é, antes de tudo, um chamado de Jesus. Estes discípulos não chamaram a si mesmos. É um chamado para fora do ambiente e das atividades cotidianas. É um chamado que requer renúncias e substituições. Finalmente é um chamado para seguir, submeter suas vontades, escolhas e capacidades a Jesus.
- Motivação: o termo que relata Jesus andando paralelamente ao mar indica intencionalidade, objetividade, propósito no andar. O termo traduzido como Jesus viu, faz supor o conhecimento ou reconhecimento dos quatro discípulos. A autoridade com que Jesus falou e o pronto atendimento dos discípulos parecem confirmar o encontro prévio na Pereia, como relatado por João, e a viagem até à Galileia. Jesus já conhecia Simão e André, Tiago e João, e eles já haviam decidido recebe-lo como seu mestre. Esse conhecimento mútuo e prévio seria o que motivou o chamado para a dedicação exclusiva ao discipulado, uma condição diferente da de quaisquer outros discípulos, na intensidade e no propósito.
- Reação: porque o chamado era de Jesus, os discípulos responderam sem interpor obstáculos, imediatamente. Renunciaram a relacionamentos, propriedades e atividades para exclusivamente seguir Jesus e serem transformados por ele. Entraram em novos relacionamentos, em novo ambiente e nova atividade. Esse é um princípio do Evangelho de Jesus Cristo, princípio determinado para a continuidade, quando finalmente Jesus lhes ordenou “… vão e façam discípulos…” Mt. 28:19.
[S] Pescadores de homens
Você vive em um tempo bastante difícil. Os crentes amam cada vez mais o mundo e o que há no mundo. Este secularismo diminui o compromisso com a igreja e a santificação dos crentes. Com isso, aparecem novas teologias para justificar o mundanismo e uma delas atinge as vocações. Cada vez mais, ensina-se aos mais jovens que vocação é qualquer profissão ou carreira; que eles agradarão a Deus se forem bonzinhos na atividade que escolherem para enriquecer; que encontrarão sua suposta vocação a partir da auto-descoberta de seus dons e preferências.
Essa pregação secularista e antropocêntrica ignora a Palavra de Deus que Marcos oferece como princípio do Evangelho. Depois que as pessoas se tornam discípulos, vocação é um chamado específico de Jesus, para a dedicação integral a segui-lo e a deixar que ele mude seu ambiente e sua atividade para cumprir exclusivamente a missão que ele recebeu do Pai e entregou à Igreja. Essa vocação ou chamado implica em renúncias e mudanças de relacionamentos, ambiente e atividades.
- Subtrair: repudie a ilusão de que uma carreira neste mundo é vocação ou chamado. Você pode continuar sendo um discípulo de Jesus e manter uma profissão como Simão, André, Tiago e João estavam fazendo. Mas, se forem chamados por Jesus, se receberem uma vocação, isso vai mudar completamente essa realidade, vai implicar em disposição, renúncia e mudança.
- Somar: esteja pronto para escutar o chamado de Jesus e quando ele vocacionar você, não coloque obstáculos, disponha-se, renuncie o que precisar renunciar e abrace uma nova vida, com novos propósitos e atividades. Não vocacione-se, não fabrique um chamado, não pense que suas habilidades e interesses revelarão o plano de Deus para você. Seja um discípulo de Jesus, alguém que ele conhece, reconhece, e então escute o que ele disser. Quando você o ouvir dizer ‘Siga-me’, deixe tudo e ande com ele exclusivamente. Ele fará de você uma nova pessoa, colocará em outro ambiente e lhe habilitará para atividades que você ainda não fez.
- Dividir: se você já é um discípulo, porém, vocacionado ou não, fazer discípulos é sua missão em Cristo. Os vocacionados deixarão empreendimentos, propriedades e até relacionamentos para se dedicar exclusivamente à missão. Todos os crentes, porém, como discípulos de Cristo, compartilharão com outros todas as coisas que Jesus nos ordenou.
- Multiplicar: matricular alunos e ensinar-lhes tudo o que Jesus ordenou é a grande estratégia determinada por Jesus (Mt 28:16-20). Não podemos dizer que somos discípulos dele se não agimos como ele ensinou. Se você for chamado, se for vocacionado, então se dedicará exclusivamente a ensinar como Jesus ensinou. Não há outra vocação, porque Jesus não nos chama para qualquer outra atividade. O Reino dele não é desse mundo (Jo 18:36).
Oro para que adolescentes e jovens sejam livres das teologias mundanas que os afastam da verdadeira vocação em Jesus Cristo. Teólogos conhecidos e até agências missionárias os afastam da excelência do ministério para comprometê-los com os interesses desse mundo. Esse não é o chamado de Jesus. A verdadeira vocação é “Sigam-me, e eu os farei pescadores de homens”.
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José Bernardo é o fundador e presidente da Agência Missionária de Mobilização Evangelística – AMME e diretor da escola de liderança para adolescentes e jovens – Pacificadores.