4. Quanto vale a vocação?

José Bernardo
Série Vocação: sete estudos bíblicos nos evangelhos para entender vocação conforme a Bíblia. A grande maioria dos alunos da escola de liderança para adolescentes e jovens – Pacificadores é de vocacionados ao ministério. Nesta série de estudos bíblicos você encontrará a visão bíblica (nos evangelhos) sobre este assunto.

Sempre que falo sobre vocação com adolescentes e jovens, a questão do sustento ou da recompensa material é indisfarçável. As pessoas querem saber como vão manter a si mesmas e ainda atender às necessidades de uma família que gostariam de formar. As pressões da família pela escolha de uma carreira também se concentram nesse tema. De onde virá o salário e outros recursos determina a decisão. Essa não é uma preocupação irrelevante e, graças a Deus, os evangelhos não economizaram nos relatos sobre o que Jesus ensinou acerca desse assunto. Vamos examinar um dos ensinos centrais sobre do Senhor sobre o preço e a recompensa do serviço para o qual ele nos chama.

Leitura bíblica: Mateus 9:35-10:10
35Jesus ia passando por todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando as boas novas do Reino e curando todas as enfermidades e doenças. 36Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor. 37Então disse aos seus discípulos: “A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos. 38Peçam, pois, ao Senhor da colheita que envie trabalhadores para a sua colheita”.
1Chamando seus doze discípulos, deu-lhes autoridade para expulsar espíritos imundos e curar todas as doenças e enfermidades.
2Estes são os nomes dos doze apóstolos: primeiro, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; 3Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; 4Simão, o zelote, e Judas Iscariotes, que o traiu.
5Jesus enviou os doze com as seguintes instruções: “Não se dirijam aos gentios, nem entrem em cidade alguma dos samaritanos. 6Antes, dirijam-se às ovelhas perdidas de Israel. 7Por onde forem, preguem esta mensagem: O Reino dos céus está próximo. 8Curem os enfermos, ressuscitem os mortos, purifiquem os leprosos, expulsem os demônios. Vocês receberam de graça; deem também de graça. 9Não levem nem ouro, nem prata, nem cobre em seus cintos; 10não levem nenhum saco de viagem, nem túnica extra, nem sandálias, nem bordão; pois o trabalhador é digno do seu sustento.

[V] O trabalhador
Mateus intercalou blocos com os discursos de Jesus e outros com o relato de suas atividades. De Mt 9:35 a 10:42 temos o segundo bloco de discursos cujo tema é principalmente a missão de pregar o Evangelho. Comparando esse bloco com Marcos e Lucas, entendemos que se trata de uma coletânea de diferentes ensinos do Senhor. Obviamente, Mateus, inspirado pelo Espírito Santo, conectou esses diferentes ensinos para nos oferecer um panorama da missão de cada crente. De todo o discurso, vamos examinar as três primeiras perícopes, ou extratos, para garantir que tenhamos suficiente contexto ao analisar  o ensino de Jesus sobre financiamento. 

  • Como Jesus exercia o seu ministério, o que ele fazia? 35Jesus ia passando por todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando as boas novas do Reino e curando todas as enfermidades e doenças. Ensinar é derivado do verbo aprender, portanto, Jesus causava o aprendizado nas sinagogas; Pregar é a ação de anunciar com autoridade, proclamar, e a mensagem de Jesus era bem específica, era a boa notícia do Reino ou governo de Deus; curar, nesse texto, vem de servir, portanto, Jesus servia ou atendia pessoas com todo o tipo de enfermidades crônicas e doenças debilitantes. O tempo verbal no original trata a ação de Jesus quase como um adjetivo: era assim que ele agia, quando andou pelas cidades e povoados. É importante acrescentar que ‘o Reino’ é uma figura de linguagem. Pensando no Reino absolutista que os judeus tinham em mente, essa figura se refere ao Rei, ao seu governo sobre tudo e sobre todos.
  • Como Jesus via as pessoas para quem ministrava, que necessidade eles percebiam nelas, que dificuldades havia para atende-las e como planejou enfrenta-las? 36Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor. 37Então disse aos seus discípulos: “A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos. 38Peçam, pois, ao Senhor da colheita que envie trabalhadores para a sua colheita”. Jesus viu as pessoas como ovelhas sem pastor, o estado delas era tal como ficam as ovelhas quando estão sem quem cuide delas. Elas estavam doentes, incapazes e oprimidas, mas Jesus viu que lhes faltava o Reino. Na figura seguinte, Jesus viu as pessoas como uma colheita. O termo usado no original se refere à estação em que a colheita é feita, portanto, as pessoas estavam na hora de serem colhidas para o Senhor. Essa visão das pessoas se relaciona com os profundos sentimentos de Jesus por elas. As duas figuras se conectam com a boa notícia do Reino: o pastor governando as ovelhas, a colheita se tornando propriedade do seus Senhor.
  • Como Jesus agiu pessoalmente no enfrentamento da necessidade de trabalhadores para alcançar as ovelhas sem pastor? 1Chamando seus doze discípulos, deu-lhes autoridade para expulsar espíritos imundos e curar todas as doenças e enfermidades. 2Estes são os nomes dos doze apóstolos: primeiro, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; 3Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; 4Simão, o zelote, e Judas Iscariotes, que o traiu. 5Jesus enviou os doze com as seguintes instruções. Três ações indicam que pedir por trabalhadores inclui algumas ações consequentes: chamar, empoderar, enviar. O termo usado para ‘chamando’ inclui o prefixo ‘pros’ o que significa que Jesus chamou os discípulos para si. Já a palavra traduzida como ‘autoridade’, tem a ideia de externar o ser, portanto, o que foi modificado é quem os discípulos eram e por isso eles puderam expulsar espíritos imundos e curar todo o tipo de doenças e enfermidades. Finalmente, o envio se deu sob instruções bem específicas.
  • Quais foram as instruções que Jesus deu aos discípulos que chamou, empoderou e enviou? “Não se dirijam aos gentios, nem entrem em cidade alguma dos samaritanos. 6Antes, dirijam-se às ovelhas perdidas de Israel. 7Por onde forem, preguem esta mensagem: O Reino dos céus está próximo. 8Curem os enfermos, ressuscitem os mortos, purifiquem os leprosos, expulsem os demônios. Jesus deu três instruções: a quem ir, a mensagem a pregar e o que fazer. Eles foram enviados às ovelhas perdidas da Casa de Israel, isto é, àquelas ovelhas que estavam separadas para a destruição. Enquanto se movessem, eles deveriam, literalmente, ‘proclamar dizendo’, o que enfatiza não somente a apresentação da mensagem, mas sua pregação, isto é, o anúncio verbal. A mensagem é a mesma que Jesus proclamava, a acessibilidade do ‘Reino’, ou seja, a disponibilidade do governo de Deus. Além disso a capacidade pessoal que Jesus lhes deu, seria usada para curar os enfermos, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos e expulsar os demônios. De modo que a  proclamação verbal do Reino é uma instrução a ser seguida, e o atendimento das necessidades o uso da capacidade imbuída.
  • Como Jesus tratou o tema do financiamento do ministério? Vocês receberam de graça; deem também de graça. 9Não levem nem ouro, nem prata, nem cobre em seus cintos; 10não levem nenhum saco de viagem, nem túnica extra, nem sandálias, nem bordão; pois o trabalhador é digno do seu sustento. Há uma tensão entre a ideia de dar gratuitamente e a do trabalhador recebendo o seu ‘troféu’. Embora este seja um momento específico em que os discípulos foram enviados para os israelitas em um período do ministério de Jesus, os princípios são apresentados como universais, visto que os vocacionados por Jesus sempre recebem gratuitamente, e sempre são trabalhadores dignos do seu sustento. Sem esperar pela interpretação, a compreensão desse texto sugere duas possibilidades. A primeira é entender o que foi recebido gratuitamente: em Mt 10:1 lemos que Jesus deu ou ofereceu autoridade, (mesma base gramatical de gratuitamente). Isso poderia fazer o ‘gratuitamente’ se referir às curas, ressurreições, purificações e expulsões, embora sabemos que o próprio ensino de Jesus também foi gratuito. A segunda possibilidade é pensar em dois modos de recompensa, o comércio e o emprego: Jesus estaria dizendo que o ministério cristão não consiste em mercadorias a serem negociadas, mas em um trabalho a ser feito. O sustento dos obreiros não vem do comercio, mas do trabalho. Embora complexo, é possível que essas duas ideias sobre financiamento do ministério estejam em questão e sejam válidas aqui.

[O] É digno
Todo esse discurso de Jesus e, várias vezes, nas seções que estudamos aqui, a obra, a missão, é a proclamação verbal do evangelho do Reino. O atendimento das necessidades das pessoas está conectado com a compaixão, a autoridade pessoal recebida e a condição de aceitação da mensagem pregada. Portanto, a missão é a proclamação e o atendimento é o caráter dos vocacionados, daqueles a quem Jesus chamou para si. A proclamação é resultado da instrução, o atendimento segue o empoderamento. A proclamação é o objetivo e a iniciativa, o atendimento é consequente. Sobretudo, o que provocou compaixão em Jesus e deve nos impulsionar a buscar mais obreiros é a necessidade que as pessoas têm de governo (pastor), por isso proclamamos o Reino.

  • Ação: ao determinar a proclamação verbal do evangelho do Reino como a missão daqueles a quem vocaciona e vincular o atendimento ao empoderamento e à aceitação da mensagem, Jesus tratou do tema do financiamento ministerial. Basicamente, definiu que aqueles que recebem o Evangelho devem suprir os trabalhadores que o proclamam. Embora o atendimento (e possivelmente também a proclamação) não devam ser comercializados, aquele que proclama o Evangelho é um trabalhador e, como tal, é digno do sustento.
  • Motivação: Para Jesus, o sustento pela proclamação do Evangelho é justo, ou seja, tem relação direta como os dois pratos de uma balança: colocada a proclamação do Evangelho em um prato, isso se equilibra com o sustento ministerial no outro. Paulo apresentou o mesmo pensamento aos gálatas quando disse: “O que está sendo instruído na palavra partilhe todas as coisas boas com aquele que o instrui” Gl 6:6. O apóstolo também se referiu à equivalência entre a proclamação espiritual e o sustento material ao dizer: “Se entre vocês semeamos coisas espirituais, seria demais colhermos de vocês coisas materiais?” 1Co 9:11.
  • Reação: o último segmento desse discurso se refere novamente ao sustento dos vocacionados para Jesus e enviados por ele: “E se alguém der mesmo que seja apenas um copo de água fria a um destes pequeninos, porque ele é meu discípulo, eu lhes asseguro que não perderá a sua recompensa” Mt 10:42. O Senhor garantiu a vantagem de dar o sustento digno àqueles que se dedicam a atender o chamado do Senhor. O obreiro é digno e sustenta-lo é vantajoso.

[S] Do seu sustento
Esse texto revela a definição de Jesus da necessidade, suprimento e manutenção do trabalho para o qual vocacionou seus discípulos. Eles que estavam em outras áreas de atuação e que obtinham seu sustento de outras fontes, agora eram chamados para se dedicar exclusivamente à proclamação do Evangelho e serem mantidos nesse trabalho. Se este é o seu caso, se você ouviu o chamado de Jesus, se recebeu uma vocação verdadeira, então coloque em prática o que aprendeu.

  • Diminuir: o sentimento de indignidade impede que muitos vocacionados se dediquem ao chamado de Jesus com confiança e os induz a procurar outras formas de sustento. Jesus usou o conceito de uma balança de dois pratos para dizer que a proclamação do Evangelho para a qual Jesus chama trabalhadores equivale ao seu sustento suficiente. Se você ainda acha que o sustento dos obreiros é indigno, você contraria o ensino de Jesus e se opõe ao exemplo dele. Por causa disso, muitos vocacionados procuram fazer negócios paralelos e o chamado à evangelização deixa de ser sua prioridade. Então ore e peça que esse sentimento de indignidade seja tirado de sua vida e uma percepção de valor da evangelização possa substituí-lo.
  • Somar: a visão correta da necessidade das pessoas e do serviço de que precisam é o tema introdutório dessa série de ensinos de Jesus. Embora houvessem tantos doentes, fracos, impuros e oprimidos, Jesus viu que eles eram como ovelhas sem pastore, sua necessidade era de governo; aquelas pessoas precisavam ser lideradas à melhoria e por isso Jesus lhes apresentou a boa notícia do Reino. Por outro lado, a ênfase do ministério de Jesus era a colheita para o Senhor da Seara. Embora as pessoas estivessem necessitadas, era aquilo que podia agradar ao Senhor, sua glória, o que devia motivar a oração e o trabalho. A falta dessa visão correta tem levado muitos vocacionados a se dedicar a um fútil ativismo social, concentrando-se no atendimento às necessidades humanas e privando as pessoas do que realmente necessitam: o governo de Deus para suas vidas, estabelecido através da proclamação do evangelho do Reino. Ore para que seus olhos sejam abertos para a mesma visão da Seara que Jesus tinha enquanto proclamava o Evangelho.
  • Dividir: vimos como a tensão entre dar gratuitamente e receber sustento pela proclamação do Evangelho se resolve finalmente. Não vamos discutir o fato de que a capacitação para atender, purificar e libertar foi sobrenatural, que não se tratava de mera ação social. O texto nos chama a dar liberalmente aquilo que recebemos de Cristo. Portanto, nesse momento, cabe fazer um inventário, como Pedro e João fizeram: “Não tenho prata nem ouro, mas o que tenho, isto lhe dou. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, ande” At 3:6. O que você recebeu de Cristo que pode repartir enquanto proclama verbalmente a mensagem do evangelho do Reino. A capacitação que os vocacionados receberam e a compaixão que o próprio Senhor tinha mostram que o socorro não é a missão, mas o caráter dos obreiros. Portanto é natural que em cumprindo a missão da proclamação, manifestemos o caráter da doação.
  • Multiplicar: a visão de Jesus, do que os vocacionados deveriam fazer e de como seriam mantidos nesse serviço é dominada pela ideia da Seara que tem um dono e que está interessado em armazenar uma grande colheita. Uma visão antropocêntrica das necessidades humanas nos levaria ao erro, nos concentraria em um atendimento estéril, passageiro e objetivamente incapaz. Como vocacionados para Jesus, devemos nos concentrar em fazer a vontade do Pai, em atender ao Senhor da Seara. Se fizermos isso, o Reino de Deus se estabelecerá sobre as pessoas e produzirá seus bons, perfeitos e agradáveis resultados. Examine seu coração, certifique-se de que você atenda ao chamado de Jesus com a visão da colheita. Então, se você encontrar pessoas que não aceitam a mensagem, que não se colocam sob o Reino, vá para a próxima casa, a próxima vila, a próxima cidade. Nós fomos chamados para agradar ao Senhor.

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José Bernardo é o fundador e presidente da Agência Missionária de Mobilização Evangelística – AMME e diretor da escola de liderança para adolescentes e jovens – Pacificadores.

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